Henrique Raposo (www.expresso.pt)
8:00 Quinta feira, 12 de julho de 2012
8:00 Quinta feira, 12 de julho de 2012
De forma cíclica, a cada verão, surgem várias coisas no dia-a-dia do bairro: as alemãs e demais nórdicas com escaldões na pele destroikizada,
as nativas com roupa mais descapotável e a ingenuidade política da
malta que faz questão de vestir aquilo que pensa. Sim, sem dar por isso,
um sujeito fica rodeado por aquelas t-shirts do Che Guevara, envergadas
por miúdos sem acesso a champô e água corrente, apesar de terem um iphone no bolso das calças rasgadas.
Ao vestirem aquela t-shirt, estes desguedelhados do papá acham que
estão a dar uma alfinetada no sistema, mas, na verdade, estão a ser
ratinhos de laboratório daquilo que Marx apelidava de "capitalismo".
Em 2012, Che é um mito só por causa dos tais porcos capitalistas.
Aquela t-shirt é um bem produzido, publicitado e comercializado como
qualquer outro. Ou será que os nossos neo-hippies (com o tablet na
mochila rasgada) fazem as suas próprias t-shirts com o tear esquecido da
avó? E, para reforçar a ligação entre o mito do Che e o "capitalismo",
convém registar que a t-shirt só é um sucesso no velho Ocidente (EUA e
Europa Ocidental), isto é, no mundo que nunca conheceu de perto as
delícias teológicas do comunismo. Nos países que ainda são comunistas, a
malta não tem t-shirts, nem do Che, nem de ninguém. Nos países que
fizeram a transição do comunismo para a sociedade liberal, a t-shirt do
Che é um objecto ofensivo, tão ofensivo como um símbolo fascista na
Europa Ocidental. É que a malta de Praga sabe uma coisa que a malta de
Lisboa desconhece: andar com uma t-shirt de um assassino não é uma cena cool.